A tradução do termo overprice (inglês para o português) significa sobrepreço ou superfaturamento. Diante disso, é possível que muitos, precipitadamente, possam presumir se tratar de uma atitude ilícita ou até mesmo de má-fé, motivo que pode levar ao questionamento sobre a permissão ou não da cobrança de honorários em percentuais acima do estabelecido pelas resoluções dos Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis.

Antonio Carlos M. Coltro[1] sobre a forma de remuneração do corretor afirma:

“A corretagem pode ser estabelecida tanto em valor certo ou determinado, como em percentual sobre a quantia referente ao negócioainda que não se conforme à tabela a tanto referente, por perfeitamente permitido que o comitente e o corretor estabeleçam percentagem diversa” (Grifo nosso).

Além do Código Civil, a Lei nº 6.530/78 regulamenta a profissão de Corretor de Imóveis e, em seu art. 17, inciso IV, estabelece a criação de tabelas de preços de serviços de corretagem, o que fortifica o argumento que não seria possível o corretor imobiliário cobrar valores além daqueles fixados em tabelas dos Conselhos Regionais.

Contudo, a Constituição Federal de 1988 ao consagrar em seu art. 170 caput e inciso IV a livre concorrência e a livre iniciativa, não os traz apenas como corolários da ordem econômica brasileira, mas também como fundamentos da República Federativa do Brasil, nos termos do art.1º, IV da CF/88.

Ademais, a livre iniciativa tem que ser exercitada de maneira afinada aos mandamentos do art.173, da Constituição Federal, que em seu §4º veda expressamente, dentre outros, a dominação dos mercados e a eliminação da concorrência.

Com isso, muito embora os Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis possuam competência para editar tabelas de preços, tais tabelas são apenas referenciais, sob pena de estar em dissonância com os princípios que regem a ordem econômica brasileira, fomentando condutas que caracterizariam padronização de preços e limitação à liberdade profissional.

Para além dos dispositivos constitucionais, a Lei nº 12.529/2011, no objetivo de corrigir distorções existentes no mercado que podem ensejar lesões ao ambiente competitivo e, por conseguinte, à coletividade, também se aplica à essa prestação de serviços.

Nesse sentido, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE adotou o posicionamento de que os valores vinculados nas tabelas de honorários são apenas mínimos e referenciais e, portanto, enunciativos. Do contrário, restaria configurada a uniformização de preços, promovendo flagrante prática anticoncorrencial.

Esse entendimento resta consolidado desde 2015, ocasião em que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE instaurou o processo administrativo nº. 08700.004974/2015-71, com a finalidade de verificar se as organizações representativas dos corretores de imóveis do país estariam violando a legislação concorrencial brasileira ao realizar os tabelamentos dos honorários de corretores, de modo que notificou todos os Conselhos Regionais, inclusive o Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Maranhão.

No referido processo, o CADE inicialmente cuidou de esclarecer que as tabelas de honorários de corretores apenas fixam valores mínimos de remuneração e não valores máximos, fato que foi confirmado pelos Conselhos Regionais, inclusive o maranhense, que se manifestaram no sentido de que os valores por eles fixados nas tabelas, de fato, são apenas um referencial mínimo de remuneração não impondo, dessa forma, óbicea valores superiores aos ali sugeridos.

Além disso, o Código de Ética Profissional, aprovado pela Resolução COFECI nº 326/92, estabelece em seu artigo 6º, inciso V que: “É vedado ao Corretor de Imóveis: ”[…]”III – promover a intermediação com cobrança de “over-price”, contudo, sob o fundamento das razões já mencionadas, o CADE estabeleceu que o Conselho Federal de Corretores de Imóveis – COFECI ao estabelecer em seu Código de Ética Profissional a obrigação de observância da tabela de honorários mínimos, prevendo sanções em caso de violação, bem como ao fixar valores máximos para a os honorários de intermediação exorbita o teor da Lei nº 6.530/78 em flagrante conduta ilegal, já que a legislação em tempo algum preceitua que o CRECI deve divulgar as tabelas homologadas e muito menos de tabelas uniformizadas.

Aliás, decidiu-se, já́, o seguinte:

Inexiste proibição legal do over price, seja na Lei no 4.116, de 1962, seja na de no 4.886, de 1965. E nenhuma ilicitude ou imoralidade se vê em prefixar, expressamente, o proprietário capaz, em ato de que participa com vontade hígida, a título de remuneração, a diferença a maior que venha a obter o corretor sobre o preço que entende adequado ao bem ofertado e, por isso, satisfatório à sua pretensão” (RT, 477/171)

Antonio Carlos Mathias Coltro[2] aborda sobre o tema, evidenciando, inclusive, a vontade livre entre as partes ao firmarem contrato:

“O fato é que segundo a regulamentação imposta pelo COFECI, o over price não é admitido, sendo de se reconhecer, todavia, que se o comitente assim entender adequado – até́ por ser de seu interesse, eventualmente, ante as circunstâncias do negócio, que a ele também tenha direito o corretor, como forma de incentivo a sua atuação, poderá́ o acréscimo obtido ser-lhe pago, especialmente quando se considera tratar-se de cláusula celebrada em autorização para venda celebrada entre partes maiores e capazes, não proibida em lei e que não fira a moral e os bons costumes. O que não se pode admitir é justamente que o corretor, por vontade própria, estabeleça quantia a título de over price, como forma de aumentar o ganho que possa ter, o que, por hipótese, poderá́ também dificultar a realização da venda, em prejuízo do comitente, motivo suficiente a justificar a vedação imposta pelo Conselho Federal.” (Grifo nosso).

O próprio Código Civil, no art.724, do capítulo que versa sobre a corretagem, dispõe que “a remuneração do corretor, se não estiver fixada em lei, nem ajustada entre as partes, será arbitrada segundo a natureza do negócio e os usos locais”.

Ou seja, conforme o artigo 104 do Código Civil que dá como válidos os contratos que tenham agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei, não há que se falar em ilegalidade do overprice.

Logo, não há como se concluir pela sua ilegalidade, desde que atendidos os princípios básicos da boa-fé e demais normativos contratuais, sob pena de se estar fomentando a formação de cartéis e violando a liberdade econômica dos corretores.

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